A SÁBADO foi à Feira da Ladra, falou com vendedores e clientes, e descobriu alguns dos objectos mais estranhos que já lá foram vendidos. O negócio já não é o que era mas vender na Feira da Ladra é mais do que isso. É um hobbie, uma forma de passar o tempo.
Reportagem de Sofia da Palma Rodrigues, fotos de Marisa Cardoso e montagem de Joana Mouta
Rosa está a passear entre as várias bancas da Feira da Ladra. Num instante, tira as medidas a um boneco, à venda numa das bancas de velharias, e no outro já está a mostrar o pequeno álbum de fotos dos tempos em que era bailarina. Com 81 anos, guarda dessa altura o sorriso grande, a figura esguia, o batom vermelho e o risco preto a contornar os olhos. “Vê-me aqui despida no Cabaret Maxime, ali já com roupa num espectáculo do Coliseu. Eu era artista, sou a mãe da Olga Cardinalli”, gaba-se. Rosa é bem disposta , fala alto e intromete-se em todas as conversas que pode: “Então ele hoje não vem vender é? Pois, pois, ontem foi para o bailarico” diz para a mãe de um vendedor habitual da feira que este sábado resolveu folgar. É uma das figuras habituais da Feira da Ladra, trata os vendedores por tu e todas as terças e sábados não falha uma visita. Para se distrair e porque, de vez em quando, lá leva uma “bugiganga”: “Sou mulher e as mulheres não resistem”.
Odília sabe-o bem e é por esse motivo que, na mesa quadrada coberta por uma toalha de seda vermelha, coloca junto à bijutaria que tem para vender a foto do falecido cantor Michael Jackson. A vendedora diz que o truque é infalível “as pessoas passam, olham para a foto do Michael, depois vêem os fios e acabam sempre por levar qualquer coisa. As mulheres são muito vaidosas…”
Tal como Rosa, a vendedora de 54 anos vai para a Feira para se divertir, porque se distrai, faz amigos, fala com pessoas diferentes e ainda se ri ao final da tarde com os colegas das outras bancas – quando os copos a mais, bebidos durante o dia, lhes começam a fazer efeito: “Já cheguei a filmar aqui cenas hilariantes com o telemóvel mas é tudo boa gente. Gosto muito disto, é um hobbie”, conta.
A maioria dos vendedores da Feira da Ladra tem mais de 50 anos e está reformada. A venda de objectos antigos é, mais do que um negócio, uma forma de se entreterem numa actividade que gostam e conhecem há muitos anos. Nota-se logo quem são. Têm bancas maiores, estão localizados nos melhores espaços, compram as licenças de ocupação e até contam com clientes fixos que acabaram por se tornar amigos. Como Carlos, o maior coleccionador de objectos nacionais relacionados com cerveja e que guarda tudo o que tenha a ver com esta bebida. Os negócios são à parte, claro. “Quem vem à Feira da Ladra procura o mais barato” mas Odília, que também vende gira-discos e vinis, não esconde que, muitas vezes, faz o preço consoante a cara ou o que as pessoas trazem vestido. “Mais ou menos pelo aspecto vemos se têm ou não possibilidade para comprar a determinado preço”.
À margem das bancadas veteranas, está, na periferia e em cima dos passeios, o chamado “negócio paralelo”. São vendedores sem licença, normalmente mais jovens, que mal vêem a polícia enrolam tudo no rectângulo de tecido estendido no chão. É como se nunca tivessem estado ali. “De vez em quando somos multados, mas muito raramente”, conta Daniel, que não quer revelar o apelido. Comercializam objectos pessoais que já não querem. Ou aquilo a que António, 54 anos – e vendedor na Feira da Ladra há 30 –, chama de “modernices”. Pilhas, capas e carregadores de telemóveis, DVDs ou livros que podem ser vistos na secção das novidades nas grandes livrarias ou lojas de cinema. António diz que não tem nada contra “eles”, “porque toda a gente tem o direito de trabalhar”. Mas lá deixa escapar: “A Feira da Ladra era o pulsar de uma cidade, agora não é nada. Isto tem é jeitos de acabar. É só modernices”.
Reportagem de Sofia da Palma Rodrigues, fotos de Marisa Cardoso e montagem de Joana Mouta
Rosa está a passear entre as várias bancas da Feira da Ladra. Num instante, tira as medidas a um boneco, à venda numa das bancas de velharias, e no outro já está a mostrar o pequeno álbum de fotos dos tempos em que era bailarina. Com 81 anos, guarda dessa altura o sorriso grande, a figura esguia, o batom vermelho e o risco preto a contornar os olhos. “Vê-me aqui despida no Cabaret Maxime, ali já com roupa num espectáculo do Coliseu. Eu era artista, sou a mãe da Olga Cardinalli”, gaba-se. Rosa é bem disposta , fala alto e intromete-se em todas as conversas que pode: “Então ele hoje não vem vender é? Pois, pois, ontem foi para o bailarico” diz para a mãe de um vendedor habitual da feira que este sábado resolveu folgar. É uma das figuras habituais da Feira da Ladra, trata os vendedores por tu e todas as terças e sábados não falha uma visita. Para se distrair e porque, de vez em quando, lá leva uma “bugiganga”: “Sou mulher e as mulheres não resistem”.
Odília sabe-o bem e é por esse motivo que, na mesa quadrada coberta por uma toalha de seda vermelha, coloca junto à bijutaria que tem para vender a foto do falecido cantor Michael Jackson. A vendedora diz que o truque é infalível “as pessoas passam, olham para a foto do Michael, depois vêem os fios e acabam sempre por levar qualquer coisa. As mulheres são muito vaidosas…”
Tal como Rosa, a vendedora de 54 anos vai para a Feira para se divertir, porque se distrai, faz amigos, fala com pessoas diferentes e ainda se ri ao final da tarde com os colegas das outras bancas – quando os copos a mais, bebidos durante o dia, lhes começam a fazer efeito: “Já cheguei a filmar aqui cenas hilariantes com o telemóvel mas é tudo boa gente. Gosto muito disto, é um hobbie”, conta.
A maioria dos vendedores da Feira da Ladra tem mais de 50 anos e está reformada. A venda de objectos antigos é, mais do que um negócio, uma forma de se entreterem numa actividade que gostam e conhecem há muitos anos. Nota-se logo quem são. Têm bancas maiores, estão localizados nos melhores espaços, compram as licenças de ocupação e até contam com clientes fixos que acabaram por se tornar amigos. Como Carlos, o maior coleccionador de objectos nacionais relacionados com cerveja e que guarda tudo o que tenha a ver com esta bebida. Os negócios são à parte, claro. “Quem vem à Feira da Ladra procura o mais barato” mas Odília, que também vende gira-discos e vinis, não esconde que, muitas vezes, faz o preço consoante a cara ou o que as pessoas trazem vestido. “Mais ou menos pelo aspecto vemos se têm ou não possibilidade para comprar a determinado preço”.
À margem das bancadas veteranas, está, na periferia e em cima dos passeios, o chamado “negócio paralelo”. São vendedores sem licença, normalmente mais jovens, que mal vêem a polícia enrolam tudo no rectângulo de tecido estendido no chão. É como se nunca tivessem estado ali. “De vez em quando somos multados, mas muito raramente”, conta Daniel, que não quer revelar o apelido. Comercializam objectos pessoais que já não querem. Ou aquilo a que António, 54 anos – e vendedor na Feira da Ladra há 30 –, chama de “modernices”. Pilhas, capas e carregadores de telemóveis, DVDs ou livros que podem ser vistos na secção das novidades nas grandes livrarias ou lojas de cinema. António diz que não tem nada contra “eles”, “porque toda a gente tem o direito de trabalhar”. Mas lá deixa escapar: “A Feira da Ladra era o pulsar de uma cidade, agora não é nada. Isto tem é jeitos de acabar. É só modernices”.
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