terça-feira, junho 08, 2010

O meu nome

Célia vem do Latim "Caecíllia" que significa "cego", sendo diminuitivo de Cecília. João vem do Hebraíco "Yohanan e significa "Deus perdoa".
Antes de nascer, os meus pais estavam convencidos que eu era um menino e até já tinham o nome previsto: Pedro Miguel.
Para surpresa geral nasceu uma menina, que segunda a opinião dos vários médicos que a minha mãe consultou, durante a gravidez, não teria qualquer chance de nascer, visto que o mioma (tumor benigno que aumenta de volume lentamente e que pode causar acidentes) iria crescer, tornando impossível o desenvolvimento do feto, cuja consequência final seria o aborto inevitável.
Determinada, levou a gravidez até ao fim e fui nascer à melhor maternidade do país, em Coimbra.
Como nasci menina, tornou-se imperativo a mudança de nome.
O meu pai sugeriu Delizía, cujo nome tinha ouvido numa estação de rádio da Nova Zelândia, quando da sua estada em Timor, a prestar serviço à nação. Na altura, a estação estava a promover um concurso sobre a qualidade da sua transmissão e para tal, quem respondesse via aerograma  (carta que se expedia por avião) à D. Delizía, recebia como prémio um livro e uma estatueta de um nativo da Nova Zelândia. O meu pai respondeu que a qualidade da transmissão era boa, recebeu o prémio, leu o livro e ficou-lhe na memória o nome.
A minha mãe, queria que eu ficasse com o nome João, que é o nome do meu pai, embora não fosse esse o caso quando pensavam que era um menino.... Foram ao registo com um nome em mente: Delizía João. Não aceitaram.
Pensaram em Maria João, mas depressa acharam que muita gente era Maria e não gostaram.
Subitamente, o meu pai lembrou-se de Célia, porque considerou o nome bonito e pouco comum. Treinaram Célia João e concordaram que era elegante e invulgar.
Célia tem um tom suave e doce, João é mais forte, não sendo agressivo, transmite protecção. Célia João é uma entoação que se funde e cativa quem ouve.
Célia é um nome feminino, João é um nome masculino, o que nos permite analisar o vasto mundo do conceito de representações, estereótipos e identidades do género.
Segundo relatam, fui um bebé robusto, cheio de força, enérgico, que contornava todos os obstáculos que surgiam. Fui crescendo, até me tornar numa "Maria Rapaz". Jogava à bola, andava de patins, de carrinhos rolantes, competia com rapazes e até batia neles, caso houvesse necessidade. Também brincava com bonecas, jogava à corda, brincava aos pais e às mães e até aos médicos, com as raparigas.
Tornei-me adolescente, determinada, provocadora, atrevida, e prática, carecterísticas consideradas mais masculinas. Naturalmente, que possuía e ainda possuo características culturalmente aceites como mais femininas.
A partir dos 15 anos cortei o cabelo curto e comecei a vestir-me de uma forma mais masculina e assim foi mais de uma década. Sentia-me bem, protegida e não tinha intenção alguma de me me vestir de outra forma. Hoje tenho consciência que considerava o meu corpo pouco feminino.
A certa altura e devagar, comecei a alterar a minha apresentação, que se tornou mais colorida, mais feminina e à minha medida, sem ser, nem parecer uma "mulherzinha".
Certo dia, um amigo, disse-me com todo o carinho que eu era maravilhosamente andrógina. Na altura não reagi muito bem, mas com alguma reflexão consegui identificar-me.
Não deixa de ser um rótulo, mas o que não o é? Começando com o nome com que crescemos, que com ele vivemos e que com ele provavelmente vamos morrer.

1 comentário:

  1. Por vezes é importante fazermos as pazes com o passado para podermos viver o presente com serenidade e projectarmos o futuro com outra perspectiva mais pacifica.

    Bjs

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